Desenho colorido mostrando os prédios, os postes e algumas pessoas sentadas

Desenhando com música (que eu não escolhi ouvir)

Tenho admiração por caricaturistas de eventos, retratistas de calçadão e outros profissionais que desenham em público com gente passando, sob o olhar dos curiosos e com música de fundo que nem sempre é suave.

Em agosto de 2019, senti como é a experiência. Foi quando o Urban Sketchers Florianópolis combinou de fazer um encontro dentro da programação da Maratona Cultural – iniciativa que espalha vários eventos pela cidade. Escolhemos o pedaço ao redor da esquina da rua Victor Meirelles com a Nunes Machado, na área agora conhecida como Centro Leste.

Sábado já costuma ser um dia agitado por ali. Em dia de Maratona, parece que estamos em um programa da E! Entertainment Television. A trilha sonora das duas horas de desenho é providenciada pelo DJ que animava a festa no pátio do Museu da Escola Catarinense, logo na frente ao Museu Victor Meirelles. Os graves reverberam na caixa torácica e tenho de falar alto para ser ouvido. Uma ou outra música eu reconheço no meio de outros hip hops recentes.

Enquanto procuramos um lugar onde sentar, a voz vinda dos alto-falantes canta “Deixa eu dizer o que penso desta vida / preciso demais desabafar”. É Claudia, sampleada por Marcelo D2 na música Desabafo.

Abro o banco dobrável no espaço entre dois carros, tiro os materiais de desenho e começo a registrar a lateral do museu e os fundos da sede do Correio. Quando entra Bombastic do Shaggy, já estou adiantado no nanquim.

Vem um grave poderoso, me lembra o início de Cult of Snap (anos 90), mas é outra música. A fiação dos postes domina a paisagem. Desenho tudo com o tira linhas, com traços irregulares, mas não chego perto da bagunça do emaranhado de cabos.

Descubro uma palmeira solitária. Espirro tinta no papel para representar a folhagem no topo. Nelly e Kelly Rowland estão à toda no dueto Dillema. Música grudenta, vai ficar a semana inteira na cabeça.

De repente, a coisa melhora com 16 Toneladas do Noriel Vilela. Percebo que as janelas do Correio saíram deslocadas meio andar acima. Vão ficar desse jeito, como no filme Quero ser John Malkovich.

Termino o nanquim. Vem Empire State of Mind de Alicia Keys com Jay Z. Faltam 45 minutos pra terminar o encontro e sigo meu plano de colorir com pastel oleoso. Achava que a paleta limitada cairia bem, mas tirou toda a ambiência e ainda escondeu o traço. Um colega sugere aplicar solvente para espalhar as cores, teste que vai ter de esperar eu ter o produto em casa.

Dou o desenho por terminado meia hora antes do fim da sessão. Em vez de fazer outro, decido circular. O DJ solta uma paulada do Stevie Wonder que até agora não sei qual é. Podia ter tocado enquanto eu ainda estava desenhando.

Converso um pouco com as participantes Carol Grilo, Antonia Ribeiro e Walkiria Düwe, que sentaram na esquina em frente ao sebo Mafalda. As três aguentaram o alarme do estabelecimento, que disparou na metade da sessão e não parou mais. E eu reclamando da música!


  • Tira-linhas Dreaming Dogs
  • Nanquim
  • Pastel oleoso
  • Papel para aquarela 38 x 28 cm

Comentários

2 respostas para “Desenhando com música (que eu não escolhi ouvir)”

  1. […] Além da venda e troca dos bolachões, rolou uma banda. Desenhar escutando música é uma experiência diferente. Você está ali alternando a atenção entre o papel e o objeto de desenho, mas escutando tudo ao redor. Lembrei de uma vez em que ouvi toda uma playlist enquanto registrava o Museu Victor Meirelles na Maratona Cultural em 2019. […]

  2. […] Fretta, as duas galerias da Assembleia Legislativa, o Mesc, o Instituto Collaço Paulo, o BRDE, o Museu Victor Meirelles, o Centro Cultural Bento Silvério, a Casa Açoriana, o Museu de Florianópolis Sérgio Grando e […]

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