Laerte e o manual para desmontar o mundo

Manual do Minotauro é uma leitura que demanda cuidado, tem de ir devagar.

Porque este álbum de Laerte tem a maior quantidade que já li de conceitos, metáforas, nonsense, non sequitur, paradoxo, absurdo, antítese, contradição e analogia por centímetro quadrado de quadrinho.

O volume de 400 páginas, lançado este ano pela Companhia das Letras, traz a produção da autora na Folha de São Paulo a partir de 2004, quando abandonou os personagens fixos e a estrutura clássica de humor para entrar na experimentação que mantém até hoje.

Terminei cada uma das 1.500 tiras – ou séries de tiras, já que algumas formam uma sequência – pensando “a que isso se refere?”. Ou ainda: “de onde saiu ideia tão genial que estava aí, esperando ser capturada?”

Ela explica: “Minha saída foi buscar recursos no modo livre e inventivo com que eu desenhava antes de fazer disso uma profissão”. Mas os quadrinhos a contradizem. Várias vezes reli uma tira tentando adivinhar o caminho inverso, da arte final até a primeira associação de ideias, e é difícil acreditar que elas nasceram só do caminho da pena.

Edição

Material tão bom (e importante) merecia uma edição mais caprichada. Não no sentido gráfico, mas editorial.

Datas, por exemplo. Percebo que alguns quadrinhos parecem comentar certos acontecimentos, mas não há indicação de época ou separação por temas. Bom lembrar que Laerte, além da tira diária, também contribui com a charge política na segunda página da Folha.

Também seria interessante saber o critério de seleção das tiras. Sendo onze anos de produção (2004 a 2015), o total daria mais que o dobro da quantidade presente no livro. Acompanhei o início da nova fase da cartunista no jornal e lembro que, em determinada época, seu computador foi roubado (e ela não tinha backup). Isso deixou alguma lacuna neste livro?

Um prefácio ou apresentação poderia dar mais contexto ou ampliar as possibilidades de leituras. Tirando os textos na contracapa e nas orelhas, o livro é espartano de adendos (Laerte talvez fizesse uma tira com essas últimas palavras).

Sempre me impressiono por que ela ainda é desconhecida em outros países. Este volume sozinho bastaria para colocá-la ao lado de Quino, Sempé, Feiffer e outros mestres do humor gráfico.

O meu comprei na Livros & Livros.


  • Manual do Minotauro
  • Laerte
  • 416 páginas
  • 21,2 ⨉ 27 cm
  • ISBN: 9786559210381
  • Quadrinhos na Cia

Comentários

Uma resposta para “Laerte e o manual para desmontar o mundo”

  1. […] menos da metade dessa meta: 22 álbuns. Verdade que alguns tijolinhos, como Berlim, Angola Janga, Manual do Minotauro e Logicomix, valem por uns dois ou três […]

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