pintura de uma cadeira de escritório rasgada

40 anos de oficinas de arte no CIC

Se tem um espaço público que é me é familiar, são os corredores das oficinas de arte do Centro Integrado de Cultura, que completam 40 anos este mês. Faz quase trinta que comecei a frequentá-las e devo ao convívio com professores e colegas algumas abordagens que adoto até hoje ao desenhar ou pintar.

O primeiro curso foi em 1994. Tinha 18 anos e havia acabado de entrar na faculdade de Jornalismo da UFSC. Era uma oficina com o artista plástico Rui Kronbauer, que fiz na esperança de “aprender a desenhar”. Imaginava que iria dominar o bê-á-bá do desenho realista: luz e sombra, anatomia e perspectiva. Ao invés disso, conheci seu processo de criação, tive contato com movimentos artísticos e fiz amizades. Mas ainda era cedo para tirar proveito quando nem eu sabia o que eu queria fazer lá.

Naquele mesmo ano, me inscrevi em uma oficina de grafite (a arte de rua) com Carlos Matuck, que ensinou sua técnica de cortar máscaras para estêncil. O workshop culminou, oficialmente, na pintura das paredes (externas) do vestiário do Centro de Desportos da UFSC. Extraoficialmente, os muros da cidade apareceram com manifestações artísticas nas semanas posteriores.

Parede com grafite do personagem Surfista Prateado
Surfista prateado grafitado com estêncil pelos idos de 1994

Voltei a frequentar os cursos no fim da década de 1990, na oficina de modelo vivo com Annette Keys. Usava só carvão e grafite porque achava que a pintura seria muito difícil, que iria sujar a roupa ou coisa parecida. Até que em uma das sessões, ela me emprestou um kit de aquarelas. Fiquei satisfeito com o resultado e, a partir dali, passei a usar tintas.

Outro aprendizado dessa oficina: desenhar grande. O CIC comprava papel kraft ou branco em rolo com mais de um metro de largura, que cortávamos em folhas presas a um cavalete. Até hoje tenho preferência por fazer desenhos do tamanho de uma folha A3 ou maiores. Aprendi que o traço vem do braço, não dos dedos.

Pintura

Segui depois para um período de alguns anos de oficinas de pintura com Mara Santos. Entendi como se prepara uma tela e como misturar as cores: usar a complementar nas sombras e tomar cuidado com o branco ou o preto puro.

Autorretrato. Acrílica sobre tela, 81 x 143 cm. Outubro de 1999,

Ali, também pintei em telas grandes. Para um autorretrato em tamanho natural, comigo em pé, usei uma tela de 1,4 metros de altura.

Esse autorretrato fez parte da primeira exposição da qual participei, uma coletiva com os colegas Eduardo Nicodemus e Lia Vainer em 2000. Mara Santos, atenta ao resultado, dizia-nos que, para uma exposição, deve-se preparar um conjunto coeso de obras. E nos botava na montagem e divulgação: além de fazer o convite, avisar a imprensa e reservar comes e bebes, não escapávamos de martelar pregos nos painéis para pendurar os quadros.

Convite de abertura da exposição “Cinco”
Convite da exposição coletiva “Cinco” (2003) com participantes da oficina de pintura de Mara Santos

Nessa fase, ia ao CIC duas vezes por semana depois do trabalho. Começava às 19h e voltava para casa depois das 21h. A atividade me absorvia: pulava a janta e, no inverno, muitas vezes ficava de camiseta.

Resultados

Nesse período, conheci muita gente. Não formamos um coletivo, não lançamos um movimento e tampouco escrevemos um manifesto. E a maioria seguiu com suas ocupações não artísticas. Mas ver como outras pessoas escolhem um tema e pintam o que lhes parece importante, e trocar opiniões com elas, foi construtivo.

Seis expositores com a professora Mara Santos
Na abertura da exposição “Corpo” (2004), com desenhos de modelo vivo, na sala Lindolf Bell. Da esquerda para a direita: Ivan Jerônimo, Marli Henicka, a professora Mara Santos, Ricardo Stutz, Rubi Caro, Mauro Beaumord e Alan Langdon

Hoje, vejo salas que antes eram espaço de experimentação e aprendizado transformadas em escritórios administrativos. Três professores seguem dando oficinas: Bebeto (gravura), Patrícia Amante (cores e design de superfície) e Jayro Schmidt (oficina da palavra).

São poucos para uma estrutura tão boa e é provável que se aposentem daqui a alguns anos. O espaço merece ser ocupado com mais oficinas e mais instrutores, ao menos para que outras pessoas tenham as mesmas oportunidades que eu tive.

Comentários

2 respostas para “40 anos de oficinas de arte no CIC”

  1. Mary Lou Rebelo

    Muito bom! A história é para ser repetida!

    1. Eu gostaria muito que as oficinas do CIC voltassem a ser o que era antes, um espaço de formação, criação, experimentalismo e diálogo.

      Mas os professores se aposentaram sem substitutos, as salas estão com equipamentos ociosos e, pelo questionário que a FCC soltou hoje, artes visuais não são mais o foco.

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